No ano de 2012, foram exibidos os seguintes filmes:
Dia 27 de abril, foi realizada a
primeira edição do ano do já tradicional projeto Raros, que retornou homenageando um dos grandes ícones da comédia italiana, Mario Monicelli, com a
exibição de A Moça com a
Pistola (La Ragazza con la
Pistola / 1968).
Durante os anos 60, Assunta (Monica
Vitti) é uma típica habitante de um vilarejo siciliano onde imperam rígidas e
arcaicas tradições familiares. Após ser raptada, seduzida e abandonada por
Vincenzo (Carlo Giuffrè), Assunta é obrigada pela família a lavar sua honra com
sangue. Munida com uma velha pistola ela empreenderá uma incansável perseguição
ao amante fugitivo; sua busca a levará até a Inglaterra, em plena efervescência
da Swinging London. Os conflitos culturais entre a modernidade de uma metrópole
inglesa e um vilarejo da Sicília colocam Assunta em situações cômicas e
inusitadas, que afetarão sua visão de mundo, assim como sua relação com os
homens que cruzam seu caminho. Monica Vitti brilha intensamente no papel da
histérica, atrapalhada e obstinada moça em busca de vingança. Como bem observou
o crítico francês Luc Moullet, “a musa de Antonioni nunca esteve mais à vontade
que sob a direção de Monicelli”.
Após anos de luta contra um câncer,
Mario Monicelli cometeu suicídio em novembro de 2010, aos 95 anos de idade,
saltando da janela de um hospital em Roma. Deixou como legado obras que
marcaram época e definiram um estilo peculiar que influenciou as comédias
italianas, um humor cruel, estridente e repleto de melancolia, que pode ser
visto em filmes como Os Eternos
Desconhecidos (1958), O Incrível Exército de Brancaleone (1966) e Meus Caros Amigos (1975).
A Moça com a Pistola (La Ragazza con la Pistola/
Itália / 1968), de Mario Monicelli. Com Monica Vitti, Carlo Giuffrè
e Stanley Baker. Duração: 100 minutos.
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Dia 29 de junho, uma sessão especial
do projeto Raros, exibiu Filme
Demência, de Carlos Reichenbach.
A sessão, que prestou homenagem à
memória do grande cineasta brasileiro há pouco falecido, exibiu justamente
aquele que ele próprio considerava seu melhor filme, numa edição do já
tradicional projeto da Sala P. F. Gastal – criado em maio de 2003 –
de exibição de filmes raros e do qual Carlão (como
costumava ser chamado por seus amigos e admiradores) era um entusiasta, tendo
lhe inspirado inclusive a realização das populares Sessões do Comodoro, no Cinesesc de São Paulo. Colaborador do
Raros, com o qual contribuía enviando vários filmes, Reichenbach foi o convidado
especial da edição número 100 do projeto, realizada há 5 anos, em 22 de junho
de 2007. Na ocasião, Reichenbach participou de uma sessão histórica, exibindo
uma versão restaurada de seu clássico Lilian M – Relatório
Confidencial (1975).
A trama de Filme
Demência, escrita em conjunto com o crítico de cinema Inácio Araújo,
acompanha a trajetória de Fausto, um industrial à beira da falência que num
momento de crise rompe seus laços familiares e munido de uma arma
mergulha na noite de São Paulo em busca de um paraíso imaginário. Trata-se de
uma livre adaptação do Fausto de Goethe, transposto para a realidade
brasileira. O filme conquistou o prêmio de melhor direção para Reichenbach no
Festival de Gramado e marcou um momento de virada em sua carreira. No ano
seguinte, no mesmo Festival de Gramado, Reichenbach receberia o Kikito de
melhor filme com Anjos do Arrabalde, consolidando sua reputação como um dos
principais nomes do cinema de autor no país.
A sessão de Filme Demência foi comentada pelo jornalista Carlos Thomaz Albornoz e pelo
montador e professor de cinema Milton
do Prado, dois dos maiores amigos e admiradores de Reichenbach em Porto
Alegre (Albornoz chegou a atuar em Bens Confiscados, que Carlão rodou no
litoral gaúcho).
Filme
Demência foi exibido numa cópia em DVD da Programadora
Brasil, projeto de difusão de filmes brasileiros do Ministério da Cultura.
A sessão tem entrada franca.
Filme Demência, de Carlos Reichenbach. Brasil, 1985. Com Ênio Gonçalves, Imara
Reis, Emílio Di Biasi e Orlando Parolini. Duração: 90 minutos
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13 de Julho, um
especial sexta-feira 13 apresentou o clássico gore oitentista Pavor na Cidade dos Zumbis (Paura nella Città dei Morti Viventi),
do lendário diretor italiano Lucio Fulci. A sessão teve entrada franca e foi
comentada pelo jornalista Carlos Thomaz Albornoz.
Na misteriosa cidade
de Dunwich, um padre comete suicídio num antigo cemitério, desencadeando uma
profecia que culminará com a abertura dos sete portais do inferno. No mesmo
instante em Nova Iorque, durante uma sessão mediúnica, a jovem sensitiva Mary
(Catriona MacColl) tem um colapso após ter visões de um futuro apocalíptico,
onde os mortos retornam das regiões infernais para subjugar a terra. Auxiliada
por Peter (Christopher George), um jornalista obstinado, Mary viaja para
Dunwich na tentativa de evitar que a profecia se concretize.
A partir de Pavor
na Cidade dos Zumbis o diretor Lucio Fulci romperia com a
narrativa tradicional para elaborar uma trilogia (com a presença de MacColl)
onde a razão seria sobrepujada pela lógica de um universo onírico macabro. Essa
atmosfera de pesadelo, em que a narrativa formal é substituída por uma
estrutura delirante, seria complementada com os filmes A Casa do
Além (L’Aldilà, 1981) e A Casa do Cemitério (Quella Villa Accanto al Cimitero,
1981).
Pavor na Cidade dos Zumbis (Paura nella Città dei Morti
Viventi). Itália, 1980, cor, 93 minutos. Direção: Lucio Fulci.
Com: Catriona MacColl, Christopher George, Carlo De Mejo e Giovanni
Lombardo Radice.
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Dia 17 de agosto o Projeto Raros apresentou A Outra Face da Violência (Rolling Thunder, EUA, 1977), diirigido
por John Flynn, e roteirizado pelo lendário Paul Schrader (Taxi Driver, Touro Indomável), A Outra Face da Violência narra
uma emblemática e cruel trama de vingança numa América setentista pós Vietnam.
O Major Charles Rane (Willian Devane) retorna para casa como herói de guerra
após passar anos como prisioneiro no Vietnam. Em seu amargo retorno ele
encontra sua esposa amando outro homem, um filho pequeno para o qual é um
completo estranho, e um país em crise, sofrendo a ressaca moral e financeira de
uma guerra sem sentido. Charles Rane é um homem sem perspectivas, um estranho
no ninho tentando se reintegrar à sociedade longe da crueldade dos campos de
batalha. Mas a violência o persegue como uma sombra, e quando um grupo de
marginais invade a sua casa em busca de dinheiro, deixando-o aleijado após uma
sessão de torturas, e matando cruelmente sua esposa e o filho que mal teve a
chance de conhecer, a única coisa que parece fazer sentido em sua vida é o
desejo de vingança. Acompanhado de um amigo neurótico de guerra, interpretado
por um jovem Tommy Lee Jones, e por uma garçonete intempestiva (Linda Haynes),
o Major Rane empreende uma violenta busca pelos assassinos.
Embalado pelo sucesso
de Taxi Driver, o
roteirista Paul Schrader vendeu para a Twentieth Century-Fox uma história de
vingança onde poderia continuar explorando suas obsessões a respeito da
crueldade humana, com seus personagens marginais e anti-heróis em situações
limítrofes. Os executivos ficaram chocados, alegando que o resultando final
havia ficado violento demais para ser distribuído pela Twentieth
Century-Fox, e assim a produção acabou sendo vendida para a mítica
distribuidora de filmes B American International Pictures, de Samuel Z. Arkoff.
Mesmo com a distribuição limitada o filme fez relativo sucesso sendo
exibido principalmente em cinemas drive
in e nas típicas sessõesgrindhouse da época, chegando a ser citado na
lista dos dez melhores filmes de 1977 organizada pelo notório crítico de cinema
Gene Siskel.
Recentemente A
Outra Face da Violência acabou incluído na seleção pessoal
compilada por Quentin Tarantino para a tradicional revista Sight
& Sound, que a cada dez anos desde 1952 publica uma lista com os
dez melhores filmes de todos os tempos. A paixão de Tarantino pelo filme de
John Flynn o levou a batizar a sua distribuidora de filmes independentes
de Rolling Thunder.
Uma obra conturbada e
seminal de um período em que o cinema americano começava a questionar
criticamente o conflito do Vietnam e seus efeitos colaterais. Enquanto o país
tentava se reerguer e compreender o fracasso desta empreitada,
Paul Schrader direcionava suas armas para a própria sociedade americana,
como se apontasse a raiz do mal. Sobre Schrader, o folclórico diretor John
Millius comentou certa vez: “Se existe um psicótico a quem não se deve nunca
vender uma arma, esse é Paul Schrader”.
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Dia 16 de novembro foi exibida a
produção denunsploitation japonesa School of The Holy Beast (Seijû Gakuen), de 1974.
School of The Holy Beast, como é conhecido
internacionalmente Seijû
Gakuen, é um dos mais curiosos exemplares deste subgênero, seja pela sua
beleza plástica ou por se tratar de uma obra advinda de um país oriental onde a
influência do catolicismo é praticamente nula em sua cultura. Realizado no
Japão por Noribumi Suzuki durante a efervescência dos chamados pinku eiga (filmes cor-de-rosa), thrillers
repletos de erotismo e violência protagonizados por mulheres, School of The Holy Beast mistura religiosidade à fórmula
praticada pelo cinema erótico japonês, gerando uma obra peculiar, cruel,
herética e repleta de estilo. Não faltam em sua estrutura regras básicas para o
exercício do gênero, blasfêmias, torturas brutais, lesbianismo, histeria
sexual, uma madre superiora sádica, e muita nudez.
School of the Holy Beast (Seijû Gakuen), de Noribumi Suzuki.
Japão, 1974. Duração: 91 minutos. Classificação indicativa: 18 anos.
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Bar Esperança, o Último que Fecha, de Hugo Carvana foi apresentado na sessão do dia 7 de
dezembro, com o apoio da Programadora Brasil, projeto de difusão de filmes
brasileiros do Ministério da Cultura.
Realizado em 1983, em pleno período
de transição democrática no Brasil, o filme de Hugo Carvana retrata com
sensibilidade extrema os dilemas no universo da classe média carioca de então.
Nesse contexto, um bar chamado Esperança é o epicentro da vida de seus
frequentadores, por onde circulam as primeiras gerações criadas no divórcio,
filhos de uma classe artística constantemente dividida entre seus desejos de
criação e a necessidade de ganhar a vida. Ganhador dos prêmios de melhor filme
no Festival de Havana e de melhor atriz (Marília Pêra), atriz coadjuvante
(Sylvia Bandeira) e roteiro no Festival de Gramado, o terceiro longa dirigido
por Carvana é dos mais exatos retratos de seu lugar e de seu tempo.
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