quarta-feira, 3 de abril de 2013

Raros exibidos em 2012



No ano de 2012, foram exibidos os seguintes filmes:


Dia 27 de abril, foi realizada a primeira edição do ano do já tradicional projeto Raros, que retornou homenageando um dos grandes ícones da comédia italiana, Mario Monicelli, com a exibição de A Moça com a Pistola (La Ragazza con la Pistola / 1968).
Durante os anos 60, Assunta (Monica Vitti) é uma típica habitante de um vilarejo siciliano onde imperam rígidas e arcaicas tradições familiares. Após ser raptada, seduzida e abandonada por Vincenzo (Carlo Giuffrè), Assunta é obrigada pela família a lavar sua honra com sangue. Munida com uma velha pistola ela empreenderá uma incansável perseguição ao amante fugitivo; sua busca a levará até a Inglaterra, em plena efervescência da Swinging London. Os conflitos culturais entre a modernidade de uma metrópole inglesa e um vilarejo da Sicília colocam Assunta em situações cômicas e inusitadas, que afetarão sua visão de mundo, assim como sua relação com os homens que cruzam seu caminho. Monica Vitti brilha intensamente no papel da histérica, atrapalhada e obstinada moça em busca de vingança. Como bem observou o crítico francês Luc Moullet, “a musa de Antonioni nunca esteve mais à vontade que sob a direção de Monicelli”.
Após anos de luta contra um câncer, Mario Monicelli cometeu suicídio em novembro de 2010, aos 95 anos de idade, saltando da janela de um hospital em Roma. Deixou como legado obras que marcaram época e definiram um estilo peculiar que influenciou as comédias italianas, um humor cruel, estridente e repleto de melancolia, que pode ser visto em filmes como Os Eternos Desconhecidos (1958), O Incrível Exército de Brancaleone (1966) e Meus Caros Amigos (1975).
A Moça com a Pistola (La Ragazza con la Pistola/ Itália / 1968), de Mario Monicelli. Com Monica Vitti, Carlo Giuffrè e Stanley Baker. Duração: 100 minutos.
_________
Dia 29 de junho,  uma sessão especial do projeto Raros, exibiu Filme Demência, de Carlos Reichenbach. 
A sessão, que prestou homenagem à memória do grande cineasta brasileiro há pouco falecido, exibiu justamente aquele que ele próprio considerava seu melhor filme, numa edição do já tradicional projeto da Sala P. F. Gastal – criado em maio de 2003 – de exibição de filmes raros e do qual Carlão (como costumava ser chamado por seus amigos e admiradores) era um entusiasta, tendo lhe inspirado inclusive a realização das populares Sessões do Comodoro, no Cinesesc de São Paulo. Colaborador do Raros, com o qual contribuía enviando vários filmes, Reichenbach foi o convidado especial da edição número 100 do projeto, realizada há 5 anos, em 22 de junho de 2007. Na ocasião, Reichenbach participou de uma sessão histórica, exibindo uma versão restaurada de seu clássico Lilian M – Relatório Confidencial (1975).
A trama de Filme Demência, escrita em conjunto com o crítico de cinema Inácio Araújo, acompanha a trajetória de Fausto, um industrial à beira da falência que num momento de crise rompe seus  laços familiares e munido de uma arma mergulha na noite de São Paulo em busca de um paraíso imaginário. Trata-se de uma livre adaptação do Fausto de Goethe, transposto para a realidade brasileira. O filme conquistou o prêmio de melhor direção para Reichenbach no Festival de Gramado e marcou um momento de virada em sua carreira. No ano seguinte, no mesmo Festival de Gramado, Reichenbach receberia o Kikito de melhor filme com Anjos do Arrabalde, consolidando sua reputação como um dos principais nomes do cinema de autor no país. 
A sessão de Filme Demência foi comentada pelo jornalista Carlos Thomaz Albornoz e pelo montador e professor de cinema Milton do Prado, dois dos maiores amigos e admiradores de Reichenbach em Porto Alegre (Albornoz chegou a atuar em Bens Confiscados, que Carlão rodou no litoral gaúcho).
Filme Demência foi exibido numa cópia em DVD da Programadora Brasil, projeto de difusão de filmes brasileiros do Ministério da Cultura. A sessão tem entrada franca.
Filme Demência, de Carlos Reichenbach. Brasil, 1985. Com Ênio Gonçalves, Imara Reis, Emílio Di Biasi e Orlando Parolini. Duração: 90 minutos
____
13 de Julho, um especial sexta-feira 13 apresentou o clássico gore oitentista Pavor na Cidade dos Zumbis (Paura nella Città dei Morti Viventi), do lendário diretor italiano Lucio Fulci. A sessão teve entrada franca e foi comentada pelo jornalista Carlos Thomaz Albornoz.
Na misteriosa cidade de Dunwich, um padre comete suicídio num antigo cemitério, desencadeando uma profecia que culminará com a abertura dos sete portais do inferno. No mesmo instante em Nova Iorque, durante uma sessão mediúnica, a jovem sensitiva Mary (Catriona MacColl) tem um colapso após ter visões de um futuro apocalíptico, onde os mortos retornam das regiões infernais para subjugar a terra. Auxiliada por Peter (Christopher George), um jornalista obstinado, Mary viaja para Dunwich na tentativa de evitar que a profecia se concretize.
A partir de Pavor na Cidade dos Zumbis o diretor Lucio Fulci romperia com a narrativa tradicional para elaborar uma trilogia (com a presença de MacColl) onde a razão seria sobrepujada pela lógica de um universo onírico macabro. Essa atmosfera de pesadelo, em que a narrativa formal é substituída por uma estrutura delirante, seria complementada com os filmes A Casa do Além (L’Aldilà, 1981) e A Casa do Cemitério (Quella Villa Accanto al Cimitero, 1981).
Pavor na Cidade dos Zumbis (Paura nella Città dei Morti Viventi). Itália, 1980, cor, 93 minutos. Direção: Lucio Fulci. Com: Catriona MacColl, Christopher George, Carlo De Mejo e Giovanni Lombardo Radice.
  
___
Dia 17 de agosto o Projeto Raros apresentou  A Outra Face da Violência (Rolling Thunder, EUA, 1977),  diirigido por John Flynn, e roteirizado pelo lendário Paul Schrader (Taxi Driver, Touro Indomável), A Outra Face da Violência  narra uma emblemática e cruel trama de vingança numa América setentista pós Vietnam.
O Major Charles Rane (Willian Devane) retorna para casa como herói de guerra após passar anos como prisioneiro no Vietnam. Em seu amargo retorno ele encontra sua esposa amando outro homem, um filho pequeno para o qual é um completo estranho, e um país em crise, sofrendo a ressaca moral e financeira de uma guerra sem sentido. Charles Rane é um homem sem perspectivas, um estranho no ninho tentando se reintegrar à sociedade longe da crueldade dos campos de batalha. Mas a violência o persegue como uma sombra, e quando um grupo de marginais invade a sua casa em busca de dinheiro, deixando-o aleijado após uma sessão de torturas, e matando cruelmente sua esposa e o filho que mal teve a chance de conhecer, a única coisa que parece fazer sentido em sua vida é o desejo de vingança. Acompanhado de um amigo neurótico de guerra, interpretado por um jovem Tommy Lee Jones, e por uma garçonete intempestiva (Linda Haynes),  o Major Rane empreende uma violenta busca pelos assassinos.
Embalado pelo sucesso de Taxi Driver, o roteirista Paul Schrader vendeu para a Twentieth Century-Fox uma história de vingança onde poderia continuar explorando suas obsessões a respeito da crueldade humana, com seus personagens marginais e anti-heróis em situações limítrofes. Os executivos ficaram chocados, alegando que o resultando final havia ficado violento demais para ser distribuído pela Twentieth Century-Fox, e assim a produção acabou sendo vendida para a mítica distribuidora de filmes B American International Pictures, de Samuel Z. Arkoff.  Mesmo com a distribuição limitada o filme fez relativo sucesso sendo exibido principalmente em cinemas drive in e nas típicas sessõesgrindhouse da época, chegando a ser citado na lista dos dez melhores filmes de 1977 organizada pelo notório crítico de cinema Gene Siskel.
Recentemente A Outra Face da Violência acabou incluído na seleção pessoal compilada por Quentin Tarantino para a tradicional revista Sight & Sound, que a cada dez anos desde 1952 publica uma lista com os dez melhores filmes de todos os tempos. A paixão de Tarantino pelo filme de John Flynn o levou a batizar a sua distribuidora de filmes independentes de Rolling Thunder.
Uma obra conturbada e seminal de um período em que o cinema americano começava a questionar criticamente o conflito do Vietnam e seus efeitos colaterais. Enquanto o país tentava se reerguer e compreender o fracasso desta empreitada, Paul Schrader direcionava suas armas para a própria sociedade americana, como se apontasse a raiz do mal. Sobre Schrader, o folclórico diretor John Millius comentou certa vez: “Se existe um psicótico a quem não se deve nunca vender uma arma, esse é Paul Schrader”.
 _____
Dia 16 de novembro foi exibida a produção denunsploitation japonesa School of The Holy Beast (Seijû Gakuen), de 1974.
School of The Holy Beast, como é conhecido internacionalmente Seijû Gakuen, é um dos mais curiosos exemplares deste subgênero, seja pela sua beleza plástica ou por se tratar de uma obra advinda de um país oriental onde a influência do catolicismo é praticamente nula em sua cultura. Realizado no Japão por Noribumi Suzuki durante a efervescência dos chamados pinku eiga (filmes cor-de-rosa), thrillers repletos de erotismo e violência protagonizados por mulheres, School of The Holy Beast mistura religiosidade à fórmula praticada pelo cinema erótico japonês, gerando uma obra peculiar, cruel, herética e repleta de estilo. Não faltam em sua estrutura regras básicas para o exercício do gênero, blasfêmias, torturas brutais, lesbianismo, histeria sexual, uma madre superiora sádica, e muita nudez.
School of the Holy Beast (Seijû Gakuen), de Noribumi Suzuki. Japão, 1974. Duração: 91 minutos. Classificação indicativa: 18 anos.
 ________
 Bar Esperança, o Último que Fecha, de Hugo Carvana foi apresentado na sessão do dia 7 de dezembro, com o apoio da Programadora Brasil, projeto de difusão de filmes brasileiros do Ministério da Cultura.
Realizado em 1983, em pleno período de transição democrática no Brasil, o filme de Hugo Carvana retrata com sensibilidade extrema os dilemas no universo da classe média carioca de então. Nesse contexto, um bar chamado Esperança é o epicentro da vida de seus frequentadores, por onde circulam as primeiras gerações criadas no divórcio, filhos de uma classe artística constantemente dividida entre seus desejos de criação e a necessidade de ganhar a vida. Ganhador dos prêmios de melhor filme no Festival de Havana e de melhor atriz (Marília Pêra), atriz coadjuvante (Sylvia Bandeira) e roteiro no Festival de Gramado, o terceiro longa dirigido por Carvana é dos mais exatos retratos de seu lugar e de seu tempo.
A sessão foi comentada pelo cineasta e crítico de cinema Fabiano de Souza.Bar Esperança, o Último que Fecha, de Hugo Carvana. Brasil, 1983. Com Marília Pêra, Hugo Carvana, Sylvia Bandeira, Paulo César Pereio e Antônio Pedro. Duração: 119 minutos. Exibição em DVD. 

Nenhum comentário :

Postar um comentário